Disco é marca do reencontro com “a turma”

Elis explica que o disco é decorrente do estado de espírito eufórico após reencontro com parceiros musicais com os quais ela tinha muita afinidade como o produtor e diretor artístico Mazolla e André Midani, produtor musical. “E assim de repente, não mais que de repente, em uma encruzilhada da vida eu dei de cara com a mesma turma e isso realmente me provocou uma sensação de euforia muito grande”.

O que é ser popular?

Elis fala sobre a discussão do que é ser popular no Brasil e como se sente “perdida” porque não se encaixa em nenhum dos grupos: nem na elite e nem nas classes mais populares.“Eu acho realmente tudo muito simpático, tudo muito engraçado, acho as pessoas todas maravilhosas, mas eu na realidade estou procurando a minha turma”.

“Cai dentro” e a parceria com Baden Powell

Elis comenta o retorno de Baden Powell ao Brasil após oito anos vivendo no exterior. Ao saber que ela gravava um novo disco ele quis incluir uma canção em “Essa Mulher”. Em parceria com Paulo Cesar Pinheiro nasceu “Cai dentro”. “Aconteceu essa gafieira, essa gafieira maravilhosa. Nossa discothéque, né coração?”.

“O Bêbado e a Equilibrista”

Elis avalia que a música pode ser um “empurrãozinho” a mais para resolver a questão do retorno dos exilados e da anistia. “São coisas que nós todos queremos, são coisas com as quais nós todos sonhamos. Parece-me que estão mais próximas do que se imaginaria há dois meses atrás quando a música foi gravada”.

“Essa Mulher”, composição de Joyce e Ana Terra

Elis comenta que as duas escreveram uma letra que conseguiu traduzir o dilema das mulheres que, assim como ela, trabalham, cuidam de casa e da família. “É uma pessoa que pensa, uma pessoa que sofre, uma pessoa que é debochada, que é irônica, que à galhofeira, que é malandra, que é moleque. Quer dizer, esse disco sou eu. Essa confusão toda aí é a confusão que eu sou”.

“Basta de Clamares Inocência”, parceria com Cartola

Ela conta como conseguiu uma composição de Cartola para o disco – durante um almoço na casa do músico - e critica a falta de acervos musicais que possam preservar a história música brasileira. “O Cartola é a maior graça, uma pessoa calma, tem uma sabedoria. O Cartola é uma pessoa maior”.

Direitos autorais

Elis comenta a sua tentativa de criar uma associação para recolher direitos autorais do trabalho dos músicos. Ela faz piada com o valores que recebe pela execução das suas músicas. “É uma quantia que eu acho ridícula, mas é o que me é dado nesse latifúndio. Quer dizer, tudo bem bicho, eu toco pouco. Ninguém escutou “Águas de Março”, nem “Romaria”, ninguém toca essas coisas”, ironiza.

Beguine dodói

Ela fala da letra de Aldir Blanc e João Bosco que é uma confissão do cotidiano.“Eu acho essa música um barato e sempre que acaba eu fico com vontade de tomar uma Margarita: tequila com limão, água, açúcar e sal. Me sinto tão mexicana cantando essa música!”

Eu, Hein Rosa?

Elis Regina conta como a composição de João Nogueira e Paulo César Pinheiro chegou até ela. Ela gostava de João Nogueira há muito tempo e estava querendo se aproximar do compositor, mas não sabia como. “Tem o problema de inibição natural de você não saber como fazer para chegar perto, será que eu vou ser bem recebida?, conta ela. Então Elis descobre que Paulo César Pinheiro, um de seus maiores amigos, era amigo de João Nogueira.

Cauby Peixoto e a Rádio Nacional

Na visita à casa de João Paulo Nogueira, Elis também ganhou a canção “Bolero de Satã”, do violonista Guinga. Para dividir os vocais da música, escolheu seu cantor predileto: Cauby Peixoto. Na entrevista , Elis fala sobre a primeira vez que escutou Cauby e sobre a presença da Rádio Nacional na sua vida. “Eu me lembro que eu estava na janela da casa, o rádio estava ligado - que o meu rádio emperrou na Rádio Nacional quando eu acho que devia ter uns 2 anos, desemperrou eu tinha uns 15. Minha mãe não escutava outra rádio. Quando o Cauby acabou de cantar 'Blue Gardine' eu estava ajoelhada do lado do rádio chorando”.

César Camargo Mariano

Responsável pela direção musical do disco e marido de Elis Regina na época de gravação, César Camargo Mariano conta que depois de muito tempo, optou por fazer um trabalho de orquestra para o disco “Essa Mulher”, “sem instrumentos sintéticos, apenas com o som original dos instrumentos”. As músicas prediletas de Mariano para esse álbum são “Essa Mulher” e “Altos e Baixos”.

Pé Sem Cabeça

Composição de Danilo Caymmi e Ana Terra é uma música que “te pega por baixo”, segundo Elis. Ela destaca o fato de ser uma “música de músico”. “Eis aí também porque que está no disco 'Essa Mulher', porque além de tudo eu também tenho um pouco de músico na minha cabeça. Uso a minha participação dentro do lance como se fosse mais um instrumento”.

Amadurecimento

“Por onde anda a Pimentinha hein, Elis?”. Questionada sobre a Elis performática do início de carreira, época dos festivais da Record, quando ganhou o apelido de Pimentinha, a cantora afirma: “Agora com 34 anos, três filhos, ia ser até um pouco ridículo continuar na mesma situação”. Elis reflete sobre o seu momento profissional, uma artista independente não na produção do disco, mas no comando da carreira. “As coisas começam a ter outro sabor. É gostoso, apesar de ser bastante mais trabalhoso. Nada, nada melhor na vida do que você ser total, completa e absoluta dona da sua cabeça, da sua vida, do seu corpo”.

Apresentações ao vivo

Elis fala sobre as dificuldades de viajar pelo país para fazer shows naquela época. “Quem está viajando?”, questiona para em seguida responder. “Ninguém está saindo de suas cidades porque não está dando e arriscar esse tipo de investimento numa hora em que nós estamos vivendo um ponto de interrogação. Ninguém sabe o que vai acontecer né? Eu acho que não está na hora. Quem sabe o ano que vem refresque pro lado da gente”. Em 1979, ano em que Elis concedeu a entrevista o Brasil vivia um momento de dificuldade política e econômica com o governo de João Batista Figueiredo, último presidente do regime militar.

Nem as aparências enganam

Nesse momento da entrevista, o apresentador Guilherme Daniel e Elis Regina começam um diálogo “enigmático”, com referência à última música do disco “As aparências enganam”, parceria de Tunai Mussi e Serginho Natureza. “Para mim não engana, bicho”, diz Elis. “Eu não compro gato por lebre. Principalmente pelo seguinte: o cara que ta me vendendo essa lebre foi o mesmo que tomou uma que eu tinha há um tempo atrás”. Elis considera que a letra da música é a mais forte do disco.

Ouça a entrevista na íntegra: