Em 2007, o piloto polonês Robert Kubica sofreu um gravíssimo acidente no Grande Prêmio do Canadá. O carro ficou totalmente destruído. A única parte que sobrou intacta foi a chamada célula de sobrevivência, que é a parte do carro de Fórmula 1 onde fica o piloto e é capaz de absorver grandes impactos, mesmo em alta velocidade. E foi justamente esta capacidade que garantiu a vida do piloto.
Os planos para o reforço da célula de sobrevivência do cockpit começaram após as mortes em 1994. Em 2000, ficou definido o tamanho mínimo das paredes de fibras de carbono de 3,5 mm. Além disso, a parte deve ter 2,5 mm de Kevlar, um material à prova de balas. O resultado é resistência em acidentes mais graves, como o de Kubica em 2007.
Para evitar que a cabeça do piloto fique desprotegida, a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) tornou obrigatória a implementação da proteção da parte traseira e lateral do carro. As paredes do cockpit também ficaram mais altas. Pilotos e especialistas apontam a mudança como a principal e mais visível em termos de segurança na categoria.
Os pilotos estão muito mais protegidos de acidentes com capotagens e de carros que passam por cima de outros. Para o jornalista Flávio Gomes, do Fox Sports, Ayrton Senna teria sobrevivido ao acidente se o carro tivesse a proteção lateral mais alta na época.
Para evitar que pneus de carros se soltem após acidentes e acertem o próprio piloto ou o público, foi implementada uma regra que obriga que os pneus sejam amarrados na suspensão. Desde 2011, duas barras de aço extras prendem os pneus ao carro para evitar que eles se soltem após acidentes. Na mesma corrida em que Senna morreu, um pneu que voou após um acidente na largada feriu quatro espectadores.
Um dos materiais mais resistentes da natureza reforçou a segurança da Fórmula 1. O material que serve como base para coletes à prova de balas não só começou a ser utilizado na categoria como se tornou obrigatório em carros. Em 2000, as células de sobrevivência passaram a ser necessariamente revestidas com o kevlar. Desta forma, a célula não tem como ser perfurada.
Desde 2005, o bico dianteiro e partes pequenas do corpo aerodinâmico dos carros são, por imposição, feitos de kevlar. A regra foi criada para evitar que estilhaços de carbono fiquem na pista após acidentes. Os capacetes também levam uma camada do material.
Criados em 1985, os testes para medir a resistência de carros, células de sobrevivência e capacetes ficaram ainda mais rígidos após a morte de Senna. Realizados no Centro Cranfields, em Bedfordshire (Inglaterra), os testes de batidas laterais, frontais, capotamentos, da coluna da direção e de diversas partes dos carros têm proporcionado a criação de carros mais rigorosos.
Em 1995, os testes de batidas laterais foram introduzidos. Em 1997, os testes em batidas traseiras passaram a ser exigidos. Em 1999, os testes de batida dianteira se tornaram mais rigorosos. Em 2002, novos testes laterais foram implantados. Atualmente, os carros passam por 13 testes estáticos, onde o carro é atingido, e cinco testes dinâmicos, onde o carro bate em uma estrutura. A partir de 2012, ficou estipulado que um carro não pode participar da pré-temporada se não tiver sido aprovado nos testes.
Um dos motivos de 1994 ser um ano trágico para a Fórmula 1 foi o desejo dos comissários de tentar equilibrar a competição – dominada pela Williams – ao proibir o uso de recursos eletrônicos (como freio ABS, controle de tração, suspensão ativa e câmbio automático). Por conta disso, os carros perderam estabilidade, mas continuaram com a mesma potência de antes.
Os itens banidos na Fórmula 1 à época não voltaram. Porém, outros recursos eletrônicos foram implementados na categoria. Na segurança, é possível citar o ECU (Eletronic Control Unit), sistema que controla e regula a aceleração, câmbio, frenagem e regulagem. Isso faz o carro ser mais estável.
O controle de telemetria (mapeamento do comportamento do carro) também foi ampliado com o passar dos anos. Isso é importante para ajustar o carro (e torná-lo mais seguro). Desde 1997, um sistema para registro de causas de acidentes está instalado em carros para fornecer dados mais precisos de acidentes. Com mais dados sobre acidentes, é possível evitá-los.
A principal mudança de segurança para a temporada de 2014 foi a regulamentação dos bicos dos carros de Fórmula 1. Nesta temporada, eles passaram a ser mais baixos. Isso evita que um carro possa acertar o meio de outro carro no caso de uma batida. Para Fábio Seixas, da Sportv, a mudança deixou os carros mais feios, porém mais seguros. “Em termos de aparência, estão horríveis. Mas é mais um exemplo de mudança de segurança”, diz.
Os motores de Fórmula 1 perderam potência se compararmos 1994 e 2014. Com isso, os carros estão menos velozes. Em 1994, haviam motores V8, V10 e V12. Em 2014, os carros têm motores V6. Para compensar a perda, os carros usam recursos sustentáveis como o ERS (Energy Recovery System). O sistema transforma energia cinética (como do uso dos freios) em potência. Mesmo assim, a eletrônica não compensa a potência da temporada de 1994.
Uma das maiores evoluções de segurança dos últimos anos foi a implementação do HANS (Head and Neck Support System, em português sistema de apoio à cabeça e ao pescoço). O dispositivo de segurança, em formato de U, é ligado ao capacete e serve para proteger o pescoço e a coluna dos pilotos em caso de acidentes graves.
A implementação do HANS não está ligada diretamente ao acidente que vitimou Senna. O projeto de usar um protetor cervical surgiu após um acidente de 1995, em que o piloto Mika Hakkinen machucou a coluna. O HANS reduz o impacto no pescoço em 86% e na cabeça em 68%. Desde 2003, é obrigatório na Fórmula 1.
Após a morte de Senna, as exigências em relação aos capacetes também aumentaram. Para ficar mais resistente, o kevlar foi incluído como um dos componentes. Os estudos para que os equipamentos absorvessem mais impacto e perdessem peso se intensificaram em 2004. Atualmente, o capacete de Fórmula 1 pesa 1,25 kg; na época do acidente de Senna, pesava 2 kg. Há exigências para o acessório se adaptar ao HANS (protetor cervical) e de diminuir a pressão aerodinâmica na cabeça do piloto. Ou seja, os capacetes estão mais leves e resistentes. E salvam vidas.
A mudança nas viseiras não foi influenciada pelo acidente de Senna. O acidente que motivou a mudança foi o de Felipe Massa, atingido por um parafuso do carro de Rubens Barrichello em 2009. A partir do acidente, começou-se a desenvolver novas implementações para as viseiras. O resultado foi a inclusão de uma faixa de zylon (material mais forte do que o kevlar) nas viseiras dos carros. Vale lembrar que a morte de Senna foi motivada por um choque da barra de suspensão que quebrou a viseira do capacete e acertou a cabeça do piloto.
Após o trágico fim de semana em Ímola, a FIA começou a repensar a segurança das pistas. Ainda em 1994, análises em computador identificaram 27 trechos de alto risco em circuitos da categoria. A curva Tamburello, no circuito de Ímola (Itália), onde Senna morreu, foi um desses trechos. O traçado da curva, que era feita a mais de 300 km/h foi substituído por um S.
A FIA continuou fazendo mudanças ao longo dos anos. Em 2003, circuitos tradicionais como Silverstone (Inglaterra), Nurburgring (Alemanha) e Suzuka (Japão) também foram alterados. Em 2006, o circuito de Spa Francorchamps (Bélgica) chegou a ficar um ano fora do calendário para que fossem feitas modificações de segurança.
Dos 16 circuitos da temporada de 1994, apenas nove prosseguem no calendário (atualmente a temporada tem vinte corridas). A motivação para a troca não foi apenas a segurança. O principal motivo foi a expansão do circo da F1 para o Oriente.
Porém, os novos circuitos da Fórmula 1 trouxeram mais segurança para o esporte, já que eles já entraram no calendário totalmente adaptados às exigências da FIA. Para Flávio Gomes, do Fox Sports, a maior mudança está no aumento da área de escape. “Os circuitos novos têm áreas de escape que são estacionamentos de supermercado”, diz.
Nessas mudanças, Ímola saiu do calendário da Fórmula 1 em 2006. Neste caso, não por causa da segurança (já que modificações deixaram a pista mais segura), mas sim porque o circuito perdeu a vaga da Itália para Monza, um dos mais tradicionais GPs da categoria.
A curva em que aconteceu o acidente fatal com Senna não tinha nenhuma barreira de pneus. O choque a 307 km/h no muro corroborou para a tragédia. No mesmo fim de semana, Rubens Barrichello sofreu uma batida semelhante à de Senna, mas foi salvo pela proteção de pneus.
Ainda em 1994, a FIA começou a exigir este tipo de barreira em curvas perigosas na Fórmula 1. Além disso, os pneus deveriam estar amarrados para evitar acidentes com o público. Em 1997, novas regras exigiram que barreiras de pneus passassem a ser parafusadas.
Após o acidente de Luciano Burti, em 2001, um cobertor passou a envolver as barreiras de pneus. Apesar de a proteção ter salvo a vida de Burti, que bateu a 270 km/h, os pneus se soltaram na hora da batida e acertaram o rosto do brasileiro.
Durante muitos anos, o cascalho e a grama cobriam a parte próxima à pista de Fórmula 1. Em 1999, o cascalho passou a ser substituído pelo asfalto para facilitar que pilotos recuperem a direção em caso de acidentes. A consequência é a diminuição de acidentes em corridas, principalmente de capotagens, já que, quando os carros freavam na brita, o risco de capotagem era maior devido ao fato do terreno ser acidentado. No asfalto, isso não acontece. Pode-se perceber também a ampliação das áreas de escape. O primeiro circuito da Fórmula 1 a ter a área de escape ampliada com asfalto foi o de Interlagos.
Na manhã do acidente em Ímola, Senna se reuniu com outros pilotos. Uma das demandas era tornar os "pit stops" mais seguros. Logo após as mortes em Ímola, a FIA reduziu as velocidades nos boxes de 120 km/h para 100 km/h. No ano passado, a velocidade nos boxes foi reduzida para 80 km/h. Alguns circuitos da Fórmula 1, como o de Mônaco, têm como velocidade limite 60 km/h.
A medida ajuda a evitar acidentes como o que ocorreu no próprio GP de Ímola de 94, quando uma roda se soltou da Minardi de Michele Alboreto e acertou um mecânico. Além da redução da velocidade, também foi aumentado o espaço dos "pit lanes", crescendo a largura dos boxes.
Quando aconteceu o acidente fatal de Senna em 1994, o atendimento médico demorou 1 minuto e 40 segundos para chegar até o carro do brasileiro, 2 minutos e 30 segundos para fazer o primeiro atendimento e 17 minutos para fazer o transporte por helicóptero.
Desde a “catastrófica primavera” de 1994 – forma como a FIA se refere ao início da temporada –, a entidade resolveu padronizar os serviços de atendimento em pistas. Toda pista deve ter quatro carros de salvamento (S-cars) e dois carros de resgate (R-cars). Nos carros de resgate devem estar um médico de emergência e quatro paramédicos. Também nos circuitos, os centros médicos devem ser mini-hospitais. Tudo isso para evitar repetir o atraso no atendimento de 1994.
Para regular e fiscalizar as regras de segurança em corridas automobilísticas, a FIA criou o Instituto de Segurança para os Esportes a Motor (Institute for Safety in MotorSport, em inglês) após os acidentes de Ímola em 1994. Muitas das modificações citadas nesta matéria são fruto justamente da criação deste instituto. Atualmente, o presidente do Instituto é Gérard Saillant, um dos maiores nomes em relação à medicina no esporte do mundo.
Fundada em 1961 e em desativada em 1982, a Associação dos Pilotos de Fórmula 1 (Grand Prix Drivers' Association, em inglês) voltou a ser reativada após as mortes de Senna e Ratzenberger, piloto austríaco que morreu um dia antes do brasileiro. Senna teve papel fundamental na volta da associação, já que na manhã do acidente em Ímola se reuniu com outros pilotos para falar de segurança. O principal papel da associação é defender o interesse dos pilotos. O atual presidente é o espanhol Pedro De La Rosa.
As regras para punições a pilotos que cometem atos imprudentes nas corridas tornaram-se mais rígidas após 1994. As punições de stop and go (ficar dez segundos parado nos boxes) passaram a ser aplicadas para pilotos que não obedecem a bandeira azul por três vezes, queimam a largada, causam acidentes ou não permitem ultrapassagens. A partir de 1995, a Superlicença também passou a ser exigida em corridas de Fórmula 1. Isso evita que pilotos “barbeiros” disputem a categoria.